Pittigliani: Do Beco para o estúdio de gravação

Armando Pittigliani folheia o livro “Bossa nova e outras bossas”. Em meio ao levantamento feito por Charles Gavin e Caetano Rodrigues, aponta as capas dos discos que produziu. Mostra LPs do Tamba Trio, Carlos Lyra, Dom Um Romão, J. T. Meirelles, Sérgio Mendes. Aos 81 anos, Pittigliani fala com entusiasmo sobre sua carreira e novos projetos, como a Casa da Bossa, enquanto planeja um livro de memórias para o ano que vem, com o título provisório de “Armando e gravando” ou “Você ainda não ouviu nada!”. Subtítulo: “Os anos dourados da MPB”.

Foram sim anos dourados. Na virada da década de 1950, a jam session do Little Club, no Beco das Garrafas, estava a todo vapor. Jazzistas se associavam à bossa nova, improvisavam sobre os temas que surgiam e os standards americanos, trocavam informações e discos, planejavam gravações. O produtor estava lá e, como diretor-artístico da Philips, levou muitos deles para o estúdio:

– O Beco das Garrafas era como o Buena Vista Social Club do Brasil – diz o produtor, em referência ao clube cubano onde importantes músicos despontaram para o sucesso internacional.

Armando Pittigliani durante entrevista em seu apartamento Foto: Bernardo Costa/coisasdamusica

Pittigliani durante entrevista em seu apartamento Frame de vídeo: Bernardo Costa/coisasdamusica

Dom Um Romão

Uma imagem desta época é a que o portal Coisas da Música destaca abaixo. Numa das poucas fotos de estúdio que guarda, Armando Pittigliani (de gravata) aparece ao lado do baterista Dom Um Romão. Trata-se do registro de uma sessão de gravação do LP “Dom Um” (1964): a estreia fonográfica do instrumentista.

Outros lançamentos importantes foram o de Baden Powell, Tamba Trio, Meirelles e Os Copa 5, Rio 65 Trio, Jorge Ben e Sergio Mendes; além do primeiro LP de MPB de Elis Regina e gravações de Carlos Lyra, Nara Leão, Os Cariocas e Jackson do Pandeiro. Ao todo, um registro de 63 artistas em mais de 100 LPs.

No estúdio da Philips: Dom Um Romão e Pittigliani; ao fundo, o flautista Copinha Foto: Arquivo pessoal

No estúdio da Philips: Dom Um Romão e Pittigliani; ao fundo, o flautista Copinha Foto: Arquivo pessoal

Sérgio Mendes: o lançamento

Quando chegou ao estúdio da Philips, na Avenida Rio Branco, no Centro do Rio, para mostrar suas músicas, o pianista Sérgio Mendes tinha uma ideia na cabeça: gravar um disco de jazz. Após ouvi-lo, o produtor Armando Pittigliani deu uma sugestão:

– Mas disco de jazz não vende, meu filho. Se quiser começar uma carreira, comece com alguma coisa que dê dinheiro. Por que você não grava um disco dançante com arranjos modernos?

Assim, gravaram “Dance moderno” (1962), o primeiro disco de Sérgio Mendes. Dois anos depois, o produtor voltava para o estúdio com o pianista. Dessa vez, para o registro de “Você ainda não ouviu nada!”: o LP de jazz que Sérgio Mendes tanto queria gravar.

Assertivo, o produtor relembra a estratégia da época:

– Vou pegar o Tom Jobim, que é meu amigo; o Moacir Santos, que é muito bom e está começando, e vamos gravar o melhor da bossa nova. Disco autoral não dá certo.

Apesar de não terem vendido bem, os dois LPs foram sucesso de crítica e abriram caminho para o sucesso internacional de Sérgio Mendes.

A Casa da Bossa

Não só de história vive Armando Pittigliani. Como todo produtor, vive de ação, e atualmente comanda a ASP Produções Artísticas. Na assinatura de e-mail, escreve: “militante fonográfico”. Pois bem, sua frente de atuação no momento, fora a preparação do livro de memórias, é a busca de patrocínio para a implementação da Casa da Bossa.

– A proposta é que o espaço abrigue um museu da bossa nova, um anfiteatro, pequenas boates, escola de música e lojas especializadas no gênero musical – enumera o produtor.

O local escolhido para o projeto é o terreno onde funcionou o Canecão, casa de shows que foi desativada em 2010 após briga judicial envolvendo a Universidade Federal do Rio de Janeiro, que alega ser dona do imóvel. O local hoje está ocupado por integrantes do movimento “Ocupa MinC”, que pedem a saída de Michel Temer da Presidência da República.

– Parece-me que a UFRJ mantém o espaço ocioso porque o terreno não é deles – diz Armando Pittigliani.

Aguardemos os desdobramentos.

 

Créditos adicionais

Foto de capa: Frame de vídeo: Bernardo Costa / portal Coisas da Música

Vídeo da entrevista com Armando Pittigliani. Música: Hó-bá-lá-lá (João Gilberto), do LP “Dance moderno”, de Sérgio Mendes. Gravadora Philips, 1962. Imagens e edição: Bernardo Costa / portal Coisas da Música

Vídeo com a íntegra do LP “Dance moderno”, de Sérgio Mendes. Gravadora Philips, 1962. Postado no YouTube por José Freitas / Búzios Bossa Blog

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14 Resultados

  1. Salve Armando Pitigliani! Saudações do produtor pernambucano que cuidou de artistas seus, via Benil Santos r Roberto Santana! Parabéns pela obra e pelo projeto Casa da Bossa!

  2. Paulo Jorge Seronni Mittelstaedt disse:

    Caro Armando.
    A música popular brasileira e a Bossa nova devem muito ao seu trabalho.
    Parabéns.
    Abraços do seu cunhado.
    Pimpo.

  3. Jean Marcel Junior disse:

    Armando Pittigliani , a história do mercado fonográfico e a MPB se complementam com a sua !! abs

  4. Dayse disse:

    Querido cunhado,sucesso para seu projeto! Você merece pelo muito que realizou pela musica Brasileira!

  5. Nonato disse:

    Esse sabia de tudo !

  6. Nonato disse:

    Esse sabia de tudo ! Grande Piti .

  7. Luiz De Rezende Puech disse:

    Aguardando ansiosamente.
    Melhor que o livro, terá sido viver isso tudo!
    Isso sim, é uma herança!

  8. BENEDITO MARIANO GAIA disse:

    Querido Armando Pittigliani !

    Você sabe que há 19 anos trabalho na pesquisa, resgate e preservação da obra musical do primo MAESTRO GAYA. Mas o que não sabe é que você é um dos maiores incentivadores para que eu continue com essa minha missão . . . MUITOBRIGADO !

    Que DEUS continue nos iluminando !!!

    • Prezado, Benedito, muito obrigado por comentar. Gostaríamos muito de entrevistá-lo sobre este trabalho de preservação da obra do Maestro Gaya. Vou lhe mandar um e-mail para o endereço que aparece no registro do portal. Grande abraço!

  9. MARCOS ARTHUR SOUHAMI disse:

    PITTI,
    TORÇO PARA QUE O PROJETO NO CANECÃO(CASA DA BOSSA), SAIA O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL.
    ABS,
    MARQUINHOS(TRINTÃO)

  10. ARMANDO PITIGLIANI,BOM DIA SOU FILHO BIOLÓGICO DO DOM UM ROMÃO,SOUBE DISSO SÓ APÓS O SEU FALECIMENTO JÁ NO BRASIL EM MESQUITA EM 2005.A MINHA AMADA E SAUDOSA MÃE O NAMOROU NA DÉCADA DE 40 QDO ELE TOCAVA NA LAPA NO RESTAURANTE ORFEÃO PORTUGUÊS,A VELHA E SAUDOSA LAPA,DOM UM CONHECEU A MINHA AVÓ QUE EU NÃO TIVE O PRAZER DE TÊ-LA CONHECIDA POIS QDO NASCI ELA JÁ HAVIA FALECIDO.NÃO CONSIGO CONTATO COM ALGUM PARENTE DO MEU PAI.VC PODERIA ME AJUDAR COM ALGUMA INFORMAÇÃO DE CONTATO.OBRIGADO.TENHO AINDA AQUELE LP GRAVADO PELO MEU PAI COM O TÍTULO DOM UM PRODUZIDO POR VC DA GRAVADORA PHILLIPS.

    • Olá, Fausto, tudo bem? Obrigado pelo comentário. Vou procurar o Pittigliani para saber se ele tem o contato de algum parente, e volto a lhe procurar. Quem pode ter algum contato também é o Arnaldo DeSouteiro, que produziu os últimos discos do Dom Um Romão. Faça contato. Gostaria de encontrá-lo. Segue meu telefone: 21 99500-0874. Bernardo. Abraços

    • Vamos combinar uma entrevista. Pode ser que a publicação repercuta na internet e os familiares apareçam. Abraços. Obrigado, Fausto.

  11. BERNARDO,BOM DIA.SÓ AGORA ABRI O SITE EM QUE VC GENTILMENTE ME DEIXOU UMA RESPOSTA EM RELAÇÃO AO MEU SAUDOSO PAI DOM UM.IREI LIGAR PARA VC E GOSTARIA SIM DE UMA ENTREVISTA.QUEM SABE ALGUM PARENTE APAREÇA.O ARNALDO DE SOUTEIRO ENTROU EM CONTATO COMIGO,FICOU MUITO INTERESSADO E DISSE QUE NO MOMENTO NÃO PODERIA ME AJUDAR.EM TODO CASO FALO COM VC.MUITO OBRIGADO FORTE ABRAÇO

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