Aqui está Di Melo, mais vivo do que nunca!

Di Melo posa em sua casa, em São Paulo Foto de Érika Lúcio / Divulgação

Depois da solicitação de entrevista, em seu perfil no Facebook, a resposta: “TUDO É PODÍVEL”. Não havia dúvida, era Di Melo que respondia. Horas mais tarde, o pernambucano de voz inconfundível arranja um sotaque carioca ao atender o telefone: “E aííÍíí…” As vogais escorregam. “Meti um carioquês em sua homenagem, você gostou?”. Começa assim a nossa conversa, em que o cantor e compositor, envolto em aura lendária, se mostra extremamente lúcido e consciente do seu trabalho: “nunca recebi nada pelo que gravei, por isso saí de cena”.  Seu retorno agora é retumbante, com o lançamento do segundo trabalho oficial, o CD “Di Melo, o imorrível”.

– Acharam por bem dizer que eu estava morto depois que fiquei seis meses fora de combate devido a um acidente de moto. Só que esqueceram de me avisar – diz o artista, antes de dar as notícias climáticas: – Aqui em São Paulo está ameaçando chuva pesada, mas está um super fim de tarde…

A capa do CD 'Di Melo, o imorrível' Arte de Ganjja Pessoa

A capa do CD ‘Di Melo, o imorrível’ Arte de Ganjja Pessoa

Segue o barco pro rumo certo: o da criação. O novo CD de Di Melo (que você ouve aqui) mantém a estética do som pesado, dançante e psicodélico do LP de 1975, tido como um marco na música brasileira. Letras descontraídas, que fazem pensar sempre fora da caixa. E que protestam, como na faixa Salve a Bandeira, “um hino de amor e louvor à terra”, contra “os vampiros que usurpam o sangue do trabalhador”.

– A minha preocupação é não fazer o que todo mundo está fazendo. Eu não pulso pelo descartável. Se aquele disco lá em 75 teve uma história, eu não vou poder colocar jamais alguma coisa que não seja condizente com o trabalho. O novo CD vai ter a sua história, vai ter o seu caminhar, letra por letra, música por música – diz o artista em entrevista ao portal Coisas da Música.

Ele voltou!, como diz a faixa de introdução do CD:

Parceria com Geraldo Vandré e Baden Powell

O novo trabalho faz menção a aspectos pouco citados da carreira de Di Melo. Como as parcerias com Geraldo Vandré, que conheceu nos anos 70, quando se apresentava no Bar Jogral, em São Paulo. Está lá a faixa Canta Maotina, que os dois fizeram caminhando pela rua.

– São palavras que nós inventamos – e Di Melo canta a música, do outro lado da linha: – Criamos meio que um vocabulário especial. É uma loucura, uma onda que pode sintonizar no mundo todo. Parece um xamã, um coisa indígena, com uma batida de fundo como se fora um tambor de guerra.

Di Melo e Geraldo Vandré viajaram juntos pelo Brasil na década de 80. Di Melo conta que era uma espécie de secretário de Vandré.

– Uma vez nós voltávamos da Paraíba para São Paulo. O carro quebrou e ele pegou um avião. Eu voltei com o carro na caçamba de um caminhão cegonha, numa viagem de 15 dias, parando em cada bar – diverte-se Di Melo: – Ainda temos 12 músicas inéditas, que dá para um disco inteiro.

Outra parceria é com Baden Powell. A música permanece inédita. Mas, no CD do Imorrível, consta a faixa Basta Bem Pensar, uma homenagem ao violonista com quem Di Melo trabalhou por três meses, na Rua Augusta:

– Eu abria o show pra ele, que me chamava de “Pureza”.

Di Melo solta o verbo

Parece que para muitos era mesmo interessante que Di Melo tivesse morrido. O artista conta que não recebeu os devidos direitos autorais pelo clássico LP de 1975, da Odeon. O disco (acima) foi feito em oito dias. Era a primeira vez que o artista entrava em um estúdio. Da gravação, participaram instrumentistas de peso como Hermeto Pascoal, Heraldo do Monte e Cláudio Bertrami. O baterista Milton Banana, grande nome da bossa nova, apareceu para uma canja, que não saiu no disco:

“Tem muita gente sampleando minha música e ninguém paga nada”

– Esse LP estourou de um forma absurda. Tocava em todas as rádios. Só para divulgação, eles colocaram 3 mil discos. Ainda tinha a música Volta, no disco do Wando, que também vendeu muito. Acontece que fui receber um trimestre de direitos autorais de apenas 11 cruzeiros. Foi aí que eu perdi o tesão de fazer as coisas. Fui pra Recife e passei a morar nas praias.

Di Melo solta o verbo:

– Desde que eu me conheço por gente, eu trabalho, trabalho, trabalho e não vejo usufruto. Todo mundo mete a mão. Inclusive lá fora, no exterior, tem muita gente sampleando minhas músicas, e ninguém me paga nada.

Calote

Há dois anos Di Melo está às voltas com um calote que diz ter recebido de um homem chamado José Clênio Lemos, depois da fuga de exemplares do LP de 75, garimpados em sebos do Brasil, para o exterior, onde foram feitas reedições. Di Melo quer os discos de volta:

– Comprei 250 LPs com ele, mandei vir da República Tcheca. Pra colocar balinha na minha boca, ele me mandou 100, faltam 150. Calculo o prejuízo hoje em R$ 100 mil. Ele parece político: promete tudo e não garante nada.

Fizemos contato com José Clênio Lemos, que não retornou. Bola pra frente. E “Di Melo, o imorrível”, cuja história está apenas começando, também sairá em vinil, no Brasil, pela Polysom.

 

Créditos adicionais:

Foto de capa: Marcelo Lelis / Reprodução da internet

Vídeo com a introdução do CD “Di Melo, o imorrível”: produção independente, 2016. Música de Di Melo e Pedro Diniz. Postado no YouTube por Di Melo Oficial

Vídeo com a íntegra do LP “Di Melo”. Gravadora Odeon, 1975. Postado no YouTube por PlayCultura

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4 Resultados

  1. RETIFICANDO, $ 120, 000,00 FOI O QUE GASTAMOS APROXIMADAMENTE ATÉ AGORA NA PRODUÇÃO DO DISCO NOVO. O IMORRÍVEL: O JOSÉ CLENIO LEMOS. MEDIA 04 REPÚBLICA TCHECA. DEVE-NOS 150 VINIS DA EMI ODEON. PAGUEI 250 ELE ME ENVIOU 100 O RESTANTE ENTROU NA ERA DO ESQUECIMENTO. A MÚSICA DO GERALDO VANDRÉ EM PARCERIA É CANTA MAOTINA. A REPORTAGEM ESTÁ UM ARRASO. ULTRAPASSOU A BARREIRA DA BELEZA. O BADEN COMEÇOU A TEMPORADA NA AUGUSTA, FOI PRO IBIRAPUERA DEPOIS ELE SEGUIU PRO RIO DE JANEIRO: SENSIBILIZADO LISONJEADO MUITO HONRADO & ENALTECIDO, É COMO ME SINTO SOU DE TODO MUITO GRATO. DI MELO.

    • Marcio Sá disse:

      Puta som o novo do imorrível, valeu pela sonzera que vc fez e ainda faz, estou esperando sair em vinil pra colocar essa bolacha pra tocar. Parabéns Di Melo. Logo vou assistir vc novamente, desta vez no Sesc.

  2. Urbanífero disse:

    Muito bom ter descoberto seu som e muito boa matéria .

  3. Obrigado a todos pelos comentários! Di Melo, agradecemos especialmente a você por ter atendido o nosso telefonema e ter esclarecido coisas importantes. Estamos honrados em tê-lo por aqui. Abraços para todos vocês, Di Melo e família.

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